Antes mesmo de se entrar no
Teatro do Instituto Ling, fica claro que estamos ali para uma festa. Um pequeno
drinque, para aquecer e descontrair, é oferecido aos convidados. Desmedida Naitchy Club é singular.
Assim como cada um que aceita o convite para este lugar onde “a música salva, o teatro redime, e o riso
transcende...”
O mais recente espetáculo da Cia
Rústica, sob a direção de Patrícia Fagundes, faz parte do Ponto de Teatro. Com
um texto fortemente autobiográfico, Heinz
Limaverde desnuda-se por completo compartilhando suas cores e seus amores. Num profundo mergulho nas memórias,
mescla reflexão, crítica e alegria. Onde o mais importante é ser feliz.
E se para isso for preciso desmedir-se, desconstruir-se, desfazer-se − fugindo de estereótipos, padrões e
(pré)conceitos − pois que seja!
Alternando algumas situações traumáticas e outras hilárias, o ator faz um
manifesto de amor e liberdade. Através do riso, nos conectamos e somos tocados
pela singeleza da obra. A pureza da entrega, desprovida de filtros, gera
empatia imediata.
O cenário é simples, mas
criativo: um grande camarim com figurinos que destacam a identidade de cada
personagem. Brilhos, cores,
transparências, excessos... nada é cotidiano, tudo é over. Assim como em seu
último trabalho solo, “O Circo de Um
Homem Só” (2011), sem sair de cena
durante os 60min, Heinz constrói seus personagens com maestria,
transformando-se, mostrando que nada nos define. Assim como os diversos
personagens em cena, podemos ser quem somos, e somos muitos. “A maior riqueza do ser humano é a sua
incompletude”.
A trilha sonora escolhida,
mesclando velhos clássicos com musicas autorais, é envolvente. Kevin Brezolin,
o músico convidado, divide o palco, mas não as atenções.
Uma das cenas que mais me tocou é
composta por uma coreografia alusiva aos ponteiros de um relógio ao som de
vozes adultas e infantil, cujo contraste enfatiza ainda mais a passagem do
tempo. Um convite à reflexão sobre a finitude e o tempo que dispomos, dentre
tantas regras e obrigações, para sermos felizes.
“Tic, Tac, Tic, Tac, passa tempo,
tempo passa”. Forte e sutil ao
mesmo tempo.
O clima é de festa, uma grande
celebração à vida que faz com que os convidados se sintam à vontade e
bem-vindos a cantar, juntos: “Bicha, preto, gordo, jovem ou travesti.” Respeitando
a beleza do singular, que não está na cara, mas no coração.
Ana Paula Bardini
Fotos: Adriana Marchiori