segunda-feira, 21 de maio de 2018

INIMIGOS NA CASA DE BONECAS







De dentro de uma caixa de papelão, aos poucos, revelam-se as pernas sensuais de uma mulher. O elemento surpresa e a beleza estética da primeira cena do espetáculo Inimigos na Casa de Bonecas causam um impacto positivo ao espectador.
 


 
A metáfora é a de uma metamorfose, de menina/mulher, que agora, precisa ganhar o mundo. Não “cabendo” mais ali na caixa/casa.  É lindo!!!
Uma cena forte, impactante, que permite conexões, dá espaço ao imaginário...e faz sonhar.  

 


Este inicio remete ao trabalho anterior da companhia, Chapeuzinho Vermelho (2017) baseada nos contos dos Irmãos Grimm, vencedora do Prêmio Açorianos nas categorias de melhor Figurino (Daniel Lion) e Ator Coadjuvante (Henrique Gonçalves) e contemplada com o Tibicuera de melhor Figurino, Trilha Sonora (Álvaro RosaCosta), Ator (Guilherme Ferrêra), Direção (Camila Bauer) e Espetáculo + Prêmio RBS TV.


A montagem Inimigos na Casa de Bonecas é o resultado da compilação de dois textos do dramaturgo norueguês Henrik Ibsen – Uma Casa de Bonecas (1879) e O Inimigo do Povo (1882), incorporada aos depoimentos colhidos via internet pelo elenco, com base no papel da mulher na sociedade atual e na violência nos dias de hoje. 

A direção é de Camila Bauer, responsável também pela dramaturgia junto com Marco Catalão e Pedro Bertoldi. A montagem traça um paralelo entre a obra de Ibsen escrita no final do século XIX e os dias atuais. O fio condutor é o personagem de Nora, talvez um dos mais emblemáticos personagens femininos da dramaturgia. Uma esposa fiel, recatada e do lar. Mãe de família e submissa, primeiro ao pai, depois ao marido como exigiam as regras de bom comportamento da época. O casamento, desgastado e longe de ser uma relação no real sentido da palavra, chega ao limite. A perfeição de uma casa de bonecas idealizada de “contos de fadas” é então posta em cheque.  A vida em sociedade cobra um preço por vezes alto demais a mulheres iguais a Nora. 
 



Em paralelo, a história principal é atravessada a todo instante por fragmentos políticos, depoimentos pessoais, dança e intervenções audiovisuais. O ritmo da narrativa é intenso durante os 90 minutos do espetáculo, sem espaços entre as cenas. A opção da encenação é ousada, não chegando a atingir o público através da emoção. É um recorte do dia a dia, quando somos bombardeados incessantemente pela mídia.


 

A proposta de juntar tantos assuntos complexos talvez tenha contribuído para que a força dramática da narrativa perdesse o foco. A potência do feminino de Nora – que por si só levantaria tantas bandeiras urgentes e atuais - ficou em segundo plano, não tendo sido atingida a curva dramática da personagem.
Camila escolheu para este projeto um elenco “de peso” no cenário teatral gaúcho. Reunindo atores como Sandra Dani, Liane Venturella, Nelson Diniz, Lauro Ramalho, Janaina Pelizzon, Álvaro RosaCosta e novas promessas como Pedro Bertoldi e Fabiane Severo.

Realizado pelo Projeto GOMPA foi o vencedor do premio internacional Ibsen Scholarship 2017, participa do Ponto de Teatro – Instituto Ling e do 13° Festival Palco Giratório SESC Poa.
Carlota Albuquerque assina a direção coreográfica do espetáculo, com destaque para as intervenções da bailarina Fabiane Severo.

O teatro contemporâneo é atravessamento de idéias, discurso político, posicionamento, questionamento. Onde o mais importante é a pergunta, não a resposta. Esta é uma obra de recortes, intervenções e a busca pelo equilíbrio.

Em curtíssima temporada no Instituto Ling, segue em cartaz até o final de maio.

 
Ana Paula Bardini



Fotos: Adriana Marchiori

terça-feira, 15 de maio de 2018

TOM NA FAZENDA

 

"TOM NA FAZENDA", do dramaturgo canadense Michel Barc Bouchard e direção de Rodrigo Portella (Insetos), é para os fortes! 
É um grito de alerta mais do que necessário nos dias atuais onde, infelizmente, o AMOR ainda luta diariamente contra o preconceito.  




Tomado de dor pela perda inesperada, um jovem publicitário da cidade grande - Tom- decide ir ao funeral de seu namorado em uma pequena cidade do interior prestar a ultima homenagem e conhecer a sua família. Ao chegar na fazenda o choque de realidade é instantâneo, mas o pior ainda está por vir... Completamente atordoado, alternando momentos de negação e raiva, a decepção aumenta ao descobrir que o companheiro nunca havia falado dele. Bastante incomodado com a situação de não poder dividir a dor que sente, Tom é interpelado de forma bruta pelo cunhado (Francis) e obrigado a mentir. Mentira é sempre mentira, mas nunca é única. Uma mentira sempre chama outra!
Conviver naquele ambiente tão diferente e "doente" permite que Tom se sinta de alguma forma próximo e, finalmente, conheça a pessoa por quem foi apaixonado. A relação que estabelece com o cunhado desde o primeiro momento é carregada de agressividade. Existe uma tensão visível entre eles que, ao atingir o ponto máximo, transforma-os para sempre.

"homossexuais aprendem a mentir antes mesmo de aprender a amar


O elenco é formado por 4 atores em belissimas atuações.
 
Armando Babaioff    merecendo destaque especial, constrói um Tom extremamente denso, personagem que exige entrega emocional visceral. 
Cada encenação é um salto no escuro e o mergulho é profundo, requer coragem. Babaioff também é responsável pela tradução do texto e produção do espetáculo.

Gustavo Vaz  (Francis) encontra o tom exato do personagem, sem ser caricato, explorando muito bem suas nuances.

Kelzy Ecard (Agatha) faz uma legitima mãe fazendeira, enlutada pelo filho, sem entender por que ele foi embora.  (No fundo, ela sabe. Mãe sempre sabe...)

Camila Nhary (Ellen/Sarah) chega em cena nos 45 do segundo tempo de maneira bombástica (e engraçada) trazendo uma reviravolta para o desfecho da história.


O cenário é um celeiro típico de fazenda, mas aos poucos vai sendo transformado em um ring de luta livre - palco de embates físicos e psíquicos- com muita sujeira, água e poeira. A concepção da luz valoriza a ambientação do cenário, sendo muito bem resolvida e utilizada durante o espetáculo.



Depois de uma longa temporada no Teatro Poeirinha (RJ), atualmente em cartaz no Teatro do Leblon (RJ), a montagem está em circulação nacional participando do 13° Festival Palco Giratório POA - Sesc
 
*(eu assisti nos 3 locais)
 
São duas horas (que praticamente não se vê passar) de um thriller psicológico ao mesmo tempo tenso e envolvente.
 
Um belo exemplo de equilíbrio
e escolha
acertada entre dramaturgia, elenco, encenação e direção.




O teatro é, e sempre foi, o espaço para se dizer o que pensa e "Tom na Fazenda" dá o seu  recado. 


AMAR SEM TEMER. 

Evoé   






 

sábado, 12 de maio de 2018

Silencio.Doc


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 Ah.. o AMOR...é algo tão magnifico e desejado  por
todos que, ao perdermos o objeto do nosso amor,nos perdemos também.
 
                                                                                                               E como dói!!!
 
Quando o término se dá de maneira traumática  ou unilateral, tanto pior.
 
Isso porque ao nos apaixonarmos tecemos sonhos, fazemos planos, construímos as nossas expectativas em cima de um ideal e preferimos esquecer que ele- o amor- só é "eterno enquanto dura". 

É a tal lei da impermanência....

Quando fatalmente acontece, assim como em um luto, precisamos experienciar todas as etapas: negação, raiva, barganha, depressão e  finalmente a aceitação, só então nos encontramos novamente e estamos aptos a nos entregar por inteiro (mais uma vez).  O tempo- senhor da razão- nestas situações, mesmo parecendo não passar, ainda é o melhor remédio.
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Este é o tema do espetáculo "Silencio.Doc" em cartaz no Teatro MuBe em São Paulo, um monólogo autobiográfico, primeiro exercício de escrita dramaturgica de Marcelo Varzea engavetado há 10 anos (mas também é a história de muitas pessoas).


O ritmo da narrativa é frenético seguindo o fio condutor do pensamento....conectando idéias, criando sinapses, alternando os mais diversos sentimentos, transitando ora por momentos de  ansiedade máxima, ora por momentos de um saudosismo masoquista em um jorro dialético de palavras que se encaixam e desencaixam.  Durante os 60 minutos do espetáculo, a palavra é usada com toda a sua força dramática.
Varzea, bastante corajoso em cena, nos presenteia com sua total entrega ao personagem, um homem romântico contemporâneo com "dores e delicias".
Ainda que tragicomédia é no encontro do ator com o drama o ponto alto da encenação: a emoção contagia.

O assunto é denso, o fluxo de informações intenso. Em determinado momento, a quarta parede é derrubada, as luzes são acesas e a platéia toma um fôlego  ao ser convidada a cantar as suas próprias dores de amor.  (ufa)

A iluminação intimista, o figurino neutro e elementos cênicos essenciais servem como base para destacar a atuação.

Espetáculo de muitas camadas, rico em sutilezas e detalhes, impossível de captar tudo de uma única vez.  Que venha a turnê!

#evoé




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INSETOS





Às vezes perceber em que ponto o bicho homem chegou pode não ser tarefa fácil. A realidade pode sim matar. Em momentos como este a arte se torna uma possibilidade de catarse e auto-análise. De sairmos do nosso "umbigo" experimentando  situações sob um outro ponto de vista, de irmos do macro ao micro, ao adentrarmos no vasto universo dos "INSETOS".


Com texto inédito de Jô Bilac- um dos dramaturgos mais produtivos de sua geração- e um elenco formado por atores fundadores da companhia, "INSETOS" foi o trabalho escolhido para comemoração dos 30 anos da Cia dos Atores- um raro exemplo de companhia teatral homogênea e bem  coordenada. 
O resultado  desta feliz união é uma encenação lúdica, repleta de significados e mensagens subliminares em um trabalho minuncioso de pesquisa e experimentação cênica, marca registrada do grupo.

Depois de uma temporada de estréia com grande sucesso no CCBB do Rio de Janeiro, a peça está em turnê e participa da 13° edição do Palco Giratório SESC POA.

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Neste espetáculo, a crítica ao sistema se faz presente e nos faz rir. Rir pra não chorar. Afinal "é complexo" percebermos o quão predadores somos como seres humanos e que a nossa "ego trip" tenha nos distanciado tanto da essência.

Durante os 80min os 5 atores não saem de cena e se revezam entre personagens de um universo apocalíptico transformando-se em gafanhoto, louva- a - deus , joaninha (trans), grilo falante, barata, borboleta, mariposa, mosquito,besouro...etc...
Numa luta ferrenha pela sobrevivência de suas espécies, onde o que prevalece é a lei do mais forte.
(*qualquer semelhança não é mera coincidência)
O texto, repleto de analogias, nos remete a um mergulho  de questionamentos existenciais.

O cenário  criado por Cesar Augusto é todo preto. Com  iluminação pontual, onde os elementos que se destacam são 2 mata-moscas gigantes, 4 lixeiras e muitos pneus utilizados de maneira criativa formando várias  composições formais diferentes ao longo do espetáculo.

Apesar de não se tratar de um musical, em alguns momentos estratégicos, algumas musicas são cantadas pelos atores. Em outros, são dubladas (seriam muito melhores se não o fossem).


O figurino, assinado por Marcelo Olinto, que assim como Cesar  também atua no espetáculo, é composto por peças simples e bastante cotidianas, com muitas sobreposições e adereços, criando um resultado despretensioso que transmite perfeitamente bem o clima de distopia.

O que se vê em cena é o amor e o prazer em fazer teatro.
É brincadeira. É jogo e experimentação. É alma. É resistência. É o desejo de viver.....afinal, mesmo com todos os problemas- e talvez por causa deles- a vida é LINDA!

Que o Brasil inteiro possa assistir!
Evoé



sábado, 5 de maio de 2018

CAZUZA- Pro dia Nascer Feliz - o Musical



Ainda não sei se é a hora certa, mas.... me sinto hoje um pouco mais à vontade para falar sobre  Cazuza Pro dia Nascer Feliz- O musical que mudou a minha vida.

Digo sem sombra de dúvidas que sou outra pessoa depois de assistir, não 1 nem 2, mas 5 vezes essa peça maravilhosa.

O melhor musical que assisti na vida. E olha que já assisti a muitas peças  inclusive algumas tive oportunidade de assistir fora do Brasil...

Preciso no entanto confessar que nunca fui muito fã do Cazuza, nem tampouco foi a história dele o que mais me comoveu na peça. Eu  gostava sim da poesia de suas letras e da facilidade com que ele tocava em questões complexas de forma simples, clara e direta falando do amor e da dor. O que mais me comoveu em cena no entanto foi a doação, entrega e comprometimento do elenco, músicos e direção cujo conjunto é algo inenarrável. Só sentindo mesmo na pele para entender. Isso foi o que mais me bateu, a capacidade daqueles artistas excepcionais através da história e da musica me levarem, por quase três horas, para  uma outra realidade, uma outra dimensão, como se eu tivesse atravessado um portal. E eu me deixei ser conduzida, eu embarquei naquela "vibe" sem medo de me perder... sem medo de ser feliz.
E eu fui...MUUUUITO FELIZ. E sofri junto também, muito!!!
Ao final de cada apresentação a sensação de aperto no peito persistia por dias, semanas até, de tão forte que batia em mim. Era tão grande que não me sentia nem apta a escrever a respeito... não cabia em mim e muito menos em um papel, tamanha a conexão. A emoção aflorada, jorrava sem contenção ao menor dos estimulos. Poder me conectar com as minhas emoções de uma forma tão verdadeira e intensa é algo relativamente novo pra mim, é algo que venho trabalhando há algum tempo, mas ainda assim não totalmente conhecido, por isso mesmo tão precioso. Amei cada segundo, vale cada centavo.... e se eu pudesse, seria como a Lucinha (Araújo), assistiria pelo menos uma vez por semana absorvendo cada palavra, apreciando cada expressão, contemplando cada sentimento. Depois que a poeira baixou e que eu pude organizar os meus sentimentos em relação a tudo o que experimentei, me vi arrebatada pelo teatro, pela arte de representar, de experimentar coisas e sensações como essa que vivi.
Sempre gostei muito de ir ao teatro, mas nunca me imaginei em outro lugar senão na platéia. Assim, "do nada" bateu em mim uma vontade deliciosamente louca (quase uma necessidade) de me jogar.
E  eu fui... ouvi meu coração e inscrevi em um curso de iniciação teatral, sem saber absolutamente o que esperar. Apenas seguindo meus instintos, cada vez mais aguçados. Se eu soubesse o quanto me faria bem e que seria tão bom teria começado há muito tempo. A sensação de poder brincar novamente, de voltar a ser leve e me conectar com o lúdico, que veio à tona com toda a sua força e criatividade, é simplesmente arrebatador....
A sensação de apostar, arriscar, ousar, entregar-(se) por inteiro é libertadora. Ainda não sei o que eu vou fazer com o teatro, mas já tenho absoluta certeza do que ele fez por mim : Me transformou para sempre....
Não tem mais jeito, é amor incondicional.

Acredito cada vez mais que nada é por acaso e que no fim, ou no começo:

“TUDO é questão de obedecer ao instinto que o coração ensina a ter.... Correr o risco, apostar num sonho de amor....o resto é sorte e azar.”

E eu sou eternamente grata por esse musical que, para mim, merecia desde já todos os prêmios e no meu coração ocupa o primeiro lugar!
(forever)
#evoé













Ana Paula Bardini

 

ROMEU+JULIETA- o Musical


Amor: linguagem atemporal

(...) Romeu e Julieta não é nem a melhor nem a mais consagrada das obras de Shakespeare, porém poucos contestarão que seja- e merecidamente- a mais amada. (Bárbara Heliodora)

 
Todos sabem que a maior história de amor de todos os tempos não tem um final feliz, isso não impede que siga nos emocionando. Romeu e Julieta é um clássico que se mantém atual através dos séculos por retratar o desejo da alma humana por um amor correspondido.

Romeu + Julieta- o Musical, em cartaz no Teatro Riachuelo Rio , tem como  ponto alto o casamento inusitado entre Shakespeare e as canções de Marisa Monte, que parecem feitas especialmente para contar essa história. Durante as duas horas de espetáculo, a plateia é arrebatada num crescente de emoções, com cenas muito bem desenhadas que ocupam alternadamente todo o palco e proscênio em atuações equilibradas. O elenco é formado por alguns nomes bastante conhecidos do teatro musical, dentre os quais um trio merece destaque especial: Stella Maria Rodrigues e sua personagam Ama, responsável por momentos engraçadíssimos, fazendo uma belíssima dupla com o Frei Lourenço de Claudio Galvan e Icaro Silva com seu impagável Mercuccio, livremente inspirado no negro gato....e sua malandragem felina.
Um elenco afinadíssimo, onde tanto o talento quanto a capacidade vocal dos 24 atores foram muito bem aproveitados nos arranjos, dando um colorido especial às musicas já conhecidas de todos.  Thiago Machado (Romeu) e Bárbara Sut (Julieta), além de formarem um casal lindo em cena, com suas vozes extremamente envolventes, ressaltam ainda mais a natureza romântica  dos personagens.
Nesta montagem a diversidade não apenas vocal, se faz presente na escolha da protagonista, uma atriz negra, e  no eclético elenco proporcionando um agradável conjunto. Com linguagem moderna e formas limpas, o cenário é composto por volumes retangulares de tamanhos diversos e grandes proporções, permitindo total mobilidade, sendo movimentadas ora por contra-regras, ora pelos próprios atores.

 
Os figurinos de João Pimenta enchem os olhos e aliados ao desenho de luz, concedem um efeito cênico espetacular.   Corpos dançantes traduzem sentimentos através das belíssimas coreografias, merecendo destaque a cena do baile de máscaras, logo no inicio do espetáculo e a do casamento que encerra  o primeiro ato deixando a plateia arrepiada e emocionada.
 

Assim como Shakespeare fazia, a direção acertada de Guilherme Leme Garcia , busca(com sucesso) aproximar o teatro do povo ao propor uma montagem contemporânea que fala a língua atemporal e universal do amor.



Um trabalho belíssimo que merece vida longa para ser visto muitas vezes.

 Ana Paula Bardini

ESPALHEM MINHAS CINZAS NA EURODISNEY

UMA OLHADA FORA DA CAIXA



A primeira sensação, logo que entramos no teatro do Instituto Ling para assistirmos a “Espalhem minhas Cinzas na EuroDisney”, é de estarmos em um espaço-tempo diferente daquele em que estávamos. Parece que fomos teletransportados para outro lugar, envolvidos por uma atmosfera futurista e estérilA presença de dois atores na primeira cena, ainda durante a entrada do público, faz um convite ao silêncio e estabelece a transição necessária `a ambientação deste não lugar.
Então entra em cena o texto do argentino Rodrigo García. São 26 monólogos que compõem uma dramaturgia densa e questionadora, uma critica escancarada ao consumismo que aponta para um futuro distópico. Alguns destes textos não passam de frases projetadas nas paredes do palco, mas são impactantes, incomodam, desacomodam. A cada instante, somos confrontados com a normose em que vivemos no dia a dia para mantermos o status quo. Sem percebermos, seguimos repetindo padrões, sem saber se a nossa escolha é mesmo nossa, pois não nos enxergamos fora da caixa. 
A diretora Adriane Mottola merece elogios ao trabalhar sobre um texto bastante amplo e sem rubricas. A complexidade do texto de García, entretanto, distribuído em monólogos independentes que se encadeiam de forma aparentemente aleatória, é tão grande que em alguns momentos ela se sobrepõe à encenação, dificultando sua total compreensão. O resultado final, porém, não é comprometido. 
O figurino assinado por Duda Cardoso dialoga com o cenário, em tons de branco e cinza claro, aliados à transparência de um mundo sem contrastes nem diferenciação, reforçando a idéia de robotização e de frieza emocional. A proposta do cenário é relativamente simples, mas de muito efeito. Aliada ao desenho de luz em uma paleta de cores frias em tons de azul, a piscina de 3 mil sacolas plásticas que ocupa o palco ganha diferentes significados ao longo dos 50 minutos de peça, alternando-se na função de cenário e na condição de personagem. A escolha do elemento plástico reforça a crítica quanto ao desrespeito do ser humano com o seu habitat e a falta de conscientização que temos em relação aos outros. O lixo que geramos é o lixo que teremos.
Uma cena ficou durante muito tempo em minha retina graças à presença cênica, à entrega e à plasticidade dos atores Áquila Mattos e Geórgia Reck. Seus personagens entrechocam-se nus durante um tempo que parecia não ter fim.
Na cena final, a frieza e o destanciamento dos personagens são finalmente rompidos, surgindo uma brecha onde os personagens abrem espaço para os atores e, com eles, brindam à vida. Depois, os cinco atores se posicionam estrategicamente no palco, em total silêncio, e fecham os olhos em um claro mergulho de conexão com a própria essência num tempo infinito de contemplação. A plateia silencia com eles e comunga deste vazio, bem-vindo e necessário. É uma cena muda que grita!
Um espetáculo é sempre único, mas precisa de tempo para encontrar seu ritmo e amadurecer, assim como nós. Algumas transições de cenas e troca de personagens ainda precisam encontrar o tom certo, mas o vigor da criação coletiva, a atenção aos mínimos detalhes e a capacidade de capturar a atenção do público e gerar reflexão, mesmo quando o texto é uma comédia, traços característicos dos 30 anos de Cia Stravaganza, estão em cena.

A sensação que prevalece ao final do espetáculo e de perplexidade, e de uma quase necessidade de ver de novoAssistam!    


Ana Paula Bardini

Isso que é amor – O musical

  Ontem fui assistir Isso que é Amor – um musical com as canções de Luan Santana . Foi uma surpresa boa... É simples e ati...